MUNDOS INSPIRADOS   

Platão, o Aqueu

Rita Espechit

escritora

espechit@telus.net

Me lembro, enfim,
do começo do mundo.

A estrutura das estrelas
a álgebra das algas:
o saber é a memória
do que não conheci.

Pitágoras de Samos
sabia: as almas
têm números.

Música ou matéria,
tudo som de algarismos.
Raiz quadrada das plantas.

A idéia das coisas
se torna visível.
A janela de um momento
se fecha sobre o outro.

Estou aqui? Não estou?
O homem dos três poderes
existiu há dois segundos?
Escorreu escada abaixo
liquefeito em couro e tecido?

O beijo decepado chicoteia o ar
cauda rajada de fera lagartixa
morrendo em fúria no rochedo quente.

Escravos carregam pedras nas sombras.
O homem bom vê o fim do túnel
se arrasta cego de luz e cansaço.

Que imagem reflete a imagem
espelhos que se namoram no escuro?
Nem oxigênio nem vácuo entre os homens.

Sócrates, o médico de almas
decreta o diagnóstico:
ambição, sede da carne,
prazeres espúrios. A arete
adormecida entre escombros.

O escultor de almas
fere as mãos no barro de Adão.
Dura missão modelar o Homem
no coração do precário homem.

Sinfonia de vozes,
embriaguez do intelecto.
O filósofo se afoga
no mar imenso do belo.

No exato ponto entre
o par e o ímpar
a equação do caos.